O dia em que sentamos juntos
- Ana Helena Reis
- 2 de jul.
- 2 min de leitura

O banco de praça era uma escultura viva do passado — esculpido a partir do tronco de uma árvore milenar, guardava em sua matéria os séculos e suas dores. Tinha três espaços cavados em forma de concha, lado a lado. Vazios. Acolhedores.
Denis chegou primeiro. Sentou-se encolhido, os ombros dobrados sobre si mesmos, como se quisesse desaparecer no próprio casulo. A alma, presa num labirinto escuro, sem saída, apenas voltas e mais voltas de angústia e vergonha. O mundo lá fora seguia, mas ele já não era capaz de alcançá-lo.
Logo depois, Débora surgiu, vacilante. Cambaleante, deixou-se cair ao lado de Denis, como se os ossos não pudessem mais sustentar o peso do que ela trazia dentro. Era uma alma penada, vagando pelos meandros do próprio vazio — um universo desfeito, sem chão, sem centro.
Mais tarde, bem mais tarde, Diva se aproximou. Os passos lentos, o olhar perdido além do horizonte. Parecia uma figura esculpida no tempo, alquebrada, tremendo sob o peso do medo que vinha crescendo dentro dela: a finitude. A certeza de um fim que se aproximava, sem que houvesse qualquer lampejo espiritual que desse sentido à travessia.
Sentaram-se ali, os três. Três conchas preenchidas por silêncios distintos. Cada qual afundado em sua própria noite.
Foi Débora quem rompeu o mutismo.
— Acabo de fugir de casa — disse, com voz trêmula. — Fugi do meu marido. Tomei coragem, enfim. Mas estou sem rumo, apavorada. Sei que ele vai me perseguir até o fim do mundo. Pode haver desgraça maior do que essa?
Denis virou-se para ela, olhos vermelhos, inchados.
— Senhora, compreendo a sua dor. Mas veja, ainda pode recomeçar. Pode buscar abrigo, trabalhar, encontrar alguém que a ajude. Eu, não. Estou atolado em dívidas impagáveis. Ameaçado. Minha família prestes a ser despejada. Não há mais saídas. Só me resta… me apagar. Pode haver desgraça maior do que essa?
Silêncio.
Ambos olharam para Diva. Esperaram. Ela demorou a responder. Quando enfim ergueu o olhar, havia uma calma estranha, uma aceitação cansada.
— Estou aqui porque me dei conta de que vivi a vida inteira sem realmente viver. Cumpri deveres. Sorri para fotos. Cozinhei, limpei, fui educada. Não tive tempo de me perguntar o que eu queria. Agora, ao fim da estrada, percebo: fui apenas o cenário da vida dos outros. E nem sei se, ao partir, alguém vai sentir falta. Pode haver desgraça maior do que essa?
O vento soprou levemente. A árvore, aquela mesma que um dia se curvara ao machado do escultor, murmurou nas folhas. O banco, com suas três conchas, parecia os embalar.
Por um tempo, nenhum deles disse mais nada.
Até que Denis, olhando para o chão, murmurou:
— Talvez… talvez este banco seja isso. Um lugar onde a gente deixa o peso e ouve o outro. Nem que seja só por hoje.
Debora, com um leve sorriso rachado, completou:
— Talvez seja o começo de algo. Ou o fim de algo velho. Não sei.
Diva fechou os olhos e encostou a cabeça no encosto áspero de madeira.
— Às vezes, tudo que precisamos é que alguém nos escute antes que o silêncio nos devore por completo.
E assim ficaram. Sentados. Três almas feridas, mas, pela primeira vez, não completamente sozinhas.
Ponto de encontro das aflições! Muito bom!