Essa é uma história bizarra, que seria cômica se não fosse trágica. Os leitores entenderão o porquê desse comentário e, não tenho dúvidas, concordarão comigo.
Em uma ensolarada manhã de segunda-feira, Nivaldo recebeu um e-mail com a melhor notícia possível – havia passado no processo de seleção para analista-júnior de uma multinacional renomada. Era tudo o que esperava como recém-formado – uma vaga nessa empresa de consultoria.
Se arrumou rapidamente, no melhor estilo de um jovem executivo: calça social, camisa de manga comprida, sapatos engraxados, e foi fazer sua primeira reunião admissional. O rapaz tinha conseguido a vaga com muito merecimento, disputando com mais de trezentos outros jovens com a mesma formação. Sentiu que o fator decisivo para ter ganho a concorrência tinha sido sua desenvoltura nas reuniões e mesas redondas. Foram quatro rodadas online bastante desafiadoras, e ele se destacou em todas.
Agora iria para a primeira reunião de integração, o que o deixava um pouco nervoso. Apesar de saber que já estava contratado, a expectativa em relação ao encontro pessoal e a impressão que causaria aos chefes deixava seu metabolismo mais acelerado, a temperatura do corpo aumentava e as consequências eram imediatas. Achou melhor, já que naquele dia o tempo estava meio frio, colocar um blazer. Já tinha utilizado esse recurso com sucesso em outras vezes, iria dar certo nessa também. E assim foi.
Nivaldo foi integrado ao grupo de novos analistas e começou sua carreira na empresa, trabalhando no sistema home-office. Competente, foi logo galgando posições, e, aí, passou a ser chamado para reuniões presenciais com clientes. Nessas reuniões, deveria apresentar os resultados do trabalho da consultoria, normalmente em pé apontando para a tela em que eram projetados os dados.
Novo desafio a enfrentar, não pelo fato de falar para uma plateia ou pela insegurança em relação ao conhecimento dos assuntos envolvidos. O que atormentava esse jovem era um uma questão fisiológica. Apesar de seu rosto bonito, cabelo sempre muito bem cortado, sorriso amplo, uma voz grave e agradável e das roupas elegantes que escolhia, tinha um problema de sobrepeso, que o fazia transpirar excessivamente.
Em momentos muito tensos ou em ambientes mais quentes, então, a produção de sudorese aumentava exponencialmente, provocando uma mancha indisfarçável na roupa. Não havia blazer que disfarçasse.
Esse problema não seria tão sério, se não fosse o constrangimento que teve que enfrentar no escritório quando, antes de sua primeira reunião com clientes, foi chamado para uma conversa privada com seu chefe:
— Nivaldo, preciso tocar em um assunto delicado com você. Sabe o quão importante é uma boa presença em frente aos clientes, nas reuniões em que vai participar daqui para frente, certo?
— Pois bem. Temos notado, aqui no escritório, que você tem um problema de suor excessivo, e isso dá uma aparência de desleixo, sabe? Sei que você não tem culpa, é involuntário, mas te peço para, de alguma forma, impedir que aconteça, pois isso depõe contra a empresa.
O jovem já esperava por isso, não foi a primeira vez que alguém fez um comentário desagradável sobre seu problema de sudorese. Mas, agora, o preconceito tinha outras implicações pois estava claro, na fala do chefe, que ele não poderia aparecer na reunião com a camisa manchada de suor.
Desacorçoado, Nivaldo decidiu compartilhar seu problema com uma grande amiga, com quem tinha intimidade suficiente para tocar nesse assunto. Ela pensou, pensou e acabou respondendo:
— Meu amigo, descobri uma forma matadora de você contornar o problema. Vou te dar quatro absorventes, e você cola na camisa, na altura das axilas, dois de cada lado. Eles vão absorver o suor e manter seca a camisa, tenho certeza!
E assim foi feito. Nivaldo conservou se emprego, e destruiu por completo sua autoestima.
Em tempos de luta pela não discriminação, essa ficção, baseada em um fato, ocorrido há alguns anos, traz à tona questões mais amplas a respeito do preconceito no mundo corporativo, que vão além do gênero, raça, opção sexual ou cor de pele.