Já cantava minha mui querida Rita Lee – Baila comigo, lá no meu esconderijo.
O meu, secretíssimo. Cheio de flores, perfumes, e tem as luzes do sol de uma tarde de outono. Raios que refletem nas frestas das cortinas voadoras na minha janela ao vento.
Uma janela para o infinito, dentro de mim. A partilhar com minha criança interior o gosto das balas de caramelo puxa-puxa compradas na estrada. A reviver o frisson dos primeiros corpo a corpo, nas aulas de dança da pré-adolescência. A sonhar amores ao som dos LPs na vitrola do quarto.
Nesse túnel do tempo, vejo as hortênsias do jardim, nas tardes ensolaradas de inverno, o telefone preto de parede no meio do corredor da casa, o DKW saia e blusa do meu pai, a coleção de livros da Agatha Christie da minha mãe.
E na hora H, me vejo de tranças brancas, bochechas coradas, deitada na grama do jardim a tomar banho de sol, à espera do lanche com pão doce, num eterno domingo.
E bailo.
A cadência me preenche com uma quentura gostosa, como aquela de um ventre em gestação. Lá, do meu esconderijo, como semente à espera da primavera, ouço um eco que reverbera no mesmo diapasão, e sai a bailar comigo, como se baila na tribo.
Lembrei das férias na montanha! E certamente os devaneios eram melhores que os livros de Ágatha Christie. kkkkk
Maravilhoso texto. Esse mergulho mágico nas lembranças de quem será sempre uma menina adorável nem que a vida a tenha transformado numa escritora admirável. G.P.